No tempo do Salazar é que era bom
Ultimamente, tenho ouvido muita boa gente com saudades do tempo do Salazar. Por isso, decidi montar uma agência de viagens. Viagens ao passado. Vai ser formidável. Mas atenção, não são para todos. Têm de se candidatar primeiro. Podes-te candidatar se e só se tiveres:
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- pedido subsídio de Natal, férias, doença ou desemprego;
- organizado uma reunião;
- criticado o governo;
- nascido pobre.
Os seleccionados poderão então optar por um dos seguintes formidáveis pacotes de viagem. Temos para todos os gostos e para toda a família. Por isso, e sem mais demora, aqui estão eles:
Fim de semana romântico para casais em Caxias (opção exótica no Tarrafal)
Alojamento em quarto duplo com água até à cintura durante pelo menos 3 noites. Se adormecerem, não acordam mais. Música e animação sem hora marcada para não perderem a pica com o sono. Manicure gratuita, não vão ter de se preocupar em cortar as unhas durante meses. Em alternativa, o novo serviço de massagens baston-Chi: vão-se sentir tão aliviados quando terminar. Para casais com filhos, temos um quarto extra de onde poderão ouvi-los gritar de entusiasmo ou não.
Rave na DGS para malta jovem
Choques eléctricos para animar, melhores que spids. A curte é tanta que te tiram a roupa toda. Mas nem te lembras do frio enquanto limpas o teu próprio sangue do chão. Não te passa pela cabeça como é que vieste aqui parar. Deve ter sido aquele vizinho bacano, a quem não emprestaste dinheiro, que veio cá dizer que alguém te viu a falar com o amigo do tio daquele tipo que dizem que é comuna. Claro que enquanto estás nesta curte não recebes salário. Se ficares doente após a estadia também não. É justo. A vida não é só curtir.
Actividades radicais no Ultramar para jovens solteiros
A tua vida nunca voltará a ser a mesma. Temos actividades radicais como apanhar bocados dos teus amigos para enviar para casa, queimar palhotas com napalm (ocupantes incluídos), matar, violar, mutilar, homens, mulheres e crianças. Com sorte, voltas cheio da style, com um andar novo cheio da pausa. Mêmo à patrão, depois de teres pisado uma anti-pessoal. Estas férias serão inesquecíveis. Vais acordar aos gritos a meio da noite ao lembrares-te delas. Para o caso de teres memória fraca, podes sempre trazer artesanato indígena como colar-de-orelha ou janguê em formol.
Turismo rural na planície Alentejana para todas as idades
50ºC ao sol, de sol a sol, sempre a bombar. Bronzeado garantido! Refeições ligeiras, vegetarianas ou com courate para os mais extrovertidos. Não queremos que ninguém apanhe uma congestão enquanto utiliza maquinaria agrícola topo-de-gama do século XIII. Cantares tradicionais à noite, very typical, porque não há água, luz e ninguém sabe ler ou escrever. Dormir, é ao relento. Mas o melhor de tudo é que estás de férias e ainda recebes dinheiro: o suficiente para pagares o que comeste.
Ah! O que eu perdi por ter nascido em 77…Realmente, no tempo do Salazar é que era…
Perdoem-me o sarcasmo, mas a imbecilidade da situação assim o exige.
Por favor, pensem antes de falar.
A “moda Salazar” já começou há pelo menos 6 anos e tem como razão de ser o descrédito da classe política, que se transformou no descrédito num regime. Recordo que num concurso realizado pela RTP há uns anos – Os Grandes Portugueses – a figura de Salazar ficou em 1º lugar com um número enorme de votos.
O fadista João Braga disse há pouco tempo na TV « Antes do 25/4 era contra o Salazar; agora admiro-o». O Otelo, que fez o 25 de Abril também já disse «Precisáva-mos de um homem com a inteligência do Salazar».
A questão é que vêm sempre Salazar como um mito, ora é um demónio ora é um génio. Nunca tentam analisar o homem com a cabeça fria, ver as suas virtudes e seus defeitos, traçar o perfil psicológico… Ora, o António que nasceu no Vimieiro, freguesia de Sta. Comba Dão também se peidava!
Podemos traçar alguns paralelismos entre a situação actual e a Primeira República (1910-1926). Na altura não existia o FMI, era a Sociedade das Nacões, e Portugal estava endividado até ao pescoço. O país caminhou para o caos social, fome generalizada, instabilidade política e terrorismo. Salazar entrou para o governo em 1928 e, de facto, conseguiu resolver os grandes problemas nacionais. Mas não foi com uma varinha de condão! Pagou as dívidas à custa de impostos brutais e sobretaxas, e acabou com o caos graças ao seu braço direito, o capitão Santos Costa que, com punho de ferro amedrontava toda a gente. Era a ditadura Salazar/Santos Costa.
*Errata:
onde se lê «Precisáva-mos», leia-se «precisávamos»
e «vêm sempre Salazar», leia-se «vêem sempre Salazar»
Ou queremos uma coisa, ou queremos outra. Ou seja, contas em dia e democracia não são compatíveis em Portugal.
Já dizia a MFLeite: “É preciso suspender a democracia durante 6 meses, pôr as coisas em ordem, e depois voltar à democracia” (era +/- isto).